sexta-feira, dezembro 30, 2005

"O Fatalista" de João Botelho

Poderemos nós acreditar nos nossos olhos?
"O Fatalista" de João Botelho, é uma obra ambígua, onde o que vemos não é o que realmente vemos. Passo a explicar, acompanhamos a viagem de um patrão e de empregado (chamemos-lhe "road movie" (?)) mas a certo momento o patrão não parece ser o patrão e o empregado não parece ser o empregado. Ou ainda melhor o narrador constantemente remete a história desenrolada no ecran para uma interactividade com o público, sendo que no final arriscado e surpreendente a resposta para tais comportamentos é dada, ou pelo menos é dada uma pequena pista cabendo a cada um a sua interpretação.

Estamos perante uma obra filosófica com contornos burlescos e humor cruel, as interpretações são tremendas e em que a realização de João Botelho é simples, mas muito detalhada. A visão artística, teatral é nos dada desde logo seja pelas personagens seja pela iluminação, onde existe uma clara referencia clássica.

É um claro jogo de aparência sociais, e de consequente crítica. Adaptado de "Jacques le Fataliste" de Denis Diderot, o argumento mantem-se bastante actual, embora apartir do meio do filme, a narrativa seja em parte interrompida e a relação do espectador com a personagem Tiago (Rogério Samora) é quebrada com a inclusão de uma negra e cruel história que embora interessante (nem que seja pela grande Rita Blanco) aparece completamente deslocada em termos de ritmo da restante narrativa.

Assim, "O Fatalista" acaba por ser um belo e estimulante exercício de cinema, capaz de cativar a audiência, soltar um sorriso do rosto da mesma e ainda surpreender, num arrojado final que provocará por uns bons momentos uma bela conversa.
Para quem tem dúvidas que em Portugal o cinema está vivo.

NeTo - 7/10