sexta-feira, novembro 18, 2005

"ENTRE O SONHO E A VIGÍLIA"
por José Oliveira


"To me, only true art can be self-indulgent, and the reason why 99 percent of movies aren't works of art is because it's not one man's vision and a true piece of art or the only films that truly matter to me are auteurist visions and auteurist works"
A frase pertence a um dos mais radicais e “perigosos” cineastas do actual cinema underground americano, que apaixonado também ele por cineastas tão peculiares e singulares e já agora também “perigosos” pela tinta que fizeram correr e pelo abanão que as suas imagens e sons sempre provocaram, como Godard, Herzog ou ainda o ultimo movimento a violentar as telas e digno de figurar nos livros – leia-se Dogma 95 – transporta para os seus filmes um universo completamente pessoal e intransmissível, manipulando a seu belo prazer as imagens e os sons, as personagens, o tempo e o espaço, resultando o seu todo em experiências limites e apocalípticas que mais não fazem do que tentar exceder os próprios limites do ecrã – como godard? como herzog?, como Von Trier? – a tela que muitos teimam em deixar virgem, chegando assim perto do que se poderá definir á falta de melhor de um cinema desencantado e lírico, também profundamente cândido e incomensuravelmente híbrido, experiência lúgubre que recusa qualquer espécie de mecanismo, qualquer espécie de narrativa, qualquer espécie de formula, convenção consagrada, para que de maneira inevitavelmente virginal possa fazer a catarse e expor o seu autor.

Absolutamente inclassificável? Se quisermos fugir daqui poderemos dizer que nos seus filmes estamos em primeiro de tudo em terreno puramente cinematográfico, onde os gestos, os olhares, os movimentos e os diálogos, a sedução e o bailado dos corpos interagem com os silêncios e as musicas criando assim algo que poderemos então chamar de puro cinema, de cinema num estado primitivo que remeta para os inícios, para uma maneira de fazer cinema que privilegiava as sensações e o culto do olhar e do sentir, de experimentar e de inovar….antes de o cinema em geral se ter deixado contaminar pelo maquinismo das formulas e dos sinais científicos, dos plots e dos gráficos.


Cinema retrógrado, então? Nunca, muito pelo contrário, ao querer de certa maneira voltar aos primórdios e recuperar a candura perdida, este cinema é investido de um irremediável sentido de perda por não acreditar no estado das coisas, mas ao mesmo tempo de uma jovialidade e de um investimento do novo – do digital por exemplo, do experimentalismo visual no sujo por exemplo – que o tornam eminentemente moderno.

Em que ficamos então? Como a sua frase explicita, como se nota ao ver os seus filmes, no que já se disse, é um cinema desencantado pela falta de risco de uma actualidade cinemática predominantemente fechada a experiências novas, ao risco…um cinema de obsessão, de vertigem que pretende ao mesmo tempo que expõe o seu autor criar algo de absoluta liberdade e em estado puro…um cinema que pretende captar a absoluta beleza de uma cena, de um momento ou de um gesto sem que tudo isto encaixe necessariamente num modelo e numa formula…e mesmo que tudo isto possa ser classificado como auto-indulgência, como pretensiosismo arrogante ou qualquer outro adjectivo próximo é inegável que ao vermos os filmes somo atacados por algo de muito alarmante e inquietante e que o próprio espectador se sente em perigo por estar em frente a algo tão estranho e tão terminal, com medo que a fita se autodestrua e o espectador com ele.

Mais uma das suas frases: “…I wanted to make a different film. I wanted to make a different kind of movie, because I don't see cinema in the same – on the same kind of terms or the same way that narrative movies have been made for the past hundred years. I mean, we started with Griffith and we ended up with – I don't know what the hell is going on now but” , só vem confirmar a radicalidade dos seus gestos libertários e totalitários no sentido da profusão de investimentos puramente cinematográficos com que ornamenta os seu filmes e que por isso e pela frase anterior faz sentido quando se invoca Faulkner a propósito deste cinema de ruptura.

Ah…o nome do cineasta: Harmony Korine.
E dos seus dois filmes: “Gummo” e “Julien-Donkey Boy”.

De que falam os filmes? Querer resumi-los seria como que contradizer os próprios filmes, negar-lhe a sua essência, sim, é inexplicável…são cenas, sequências…entre o sonho e a vigília…

cinema.

====>LINKS:

www.harmony-korine.com/

www.angelfire.com/ab/harmonykorine/

1 Comments:

At 7:55 da tarde, Blogger o terceiro homem said...

Dos filmes do Harmony Korine, só vi o "Gummo", além dos outros em que escreveu o argumento. Foi uma experiência única e, de facto, não se podem resumir. É preciso vê-los e revê-los.

 

Enviar um comentário

<< Home