quinta-feira, novembro 10, 2005

"O Fiel Jardineiro" de Fernando Meirelles


«Some very nasty things can be found under rocks, especially in foreign gardens»

Após um retrato cruel das favelas brasileiras em "A Cidade de Deus", Fernando Meirelles assume com pulso firme uma adaptação da obra literária "The Constant Gardener" de John Le Carré, numa produção conjunta entre a Grã-Bretanha e a Alemanha, na qual é retratada uma África viva, mas completamente decaadente a poucos passos da morte.

Em pleno coração do Quénia, Tessa Quayle uma corajosa activista é encontrada morta, após ter sido violada e mutilada, assim como a equipa que a acompanhava. Este é o ponto de partida para uma viagem de (auto) descoberta por parte de Justin Quayle, representante do Alto Comissariado Britânico e marido de Tessa. Tessa e Justin, são um casal de oposto, enquanto ela é corajosa e interventiva, Justin é um pacato e recatado diplomata. A sua relação é plena de amor, mas as ultimas descobertas de Tessa levam-na a viver em segredo, e é desses segredos que Justin irá viver após a morte de Tessa. Justin procura descobrir o porquê de tanto secretismo e acaba por descobrir uma mulher que nunca conhecera.

Um dos pontos fortes do novo filme de Meirelles é a constante renovação narrativa, temática e consequentemente sociológica. É de facil percepção que nos envontramos perante um filme com duas partes distintas (ou talvez não tão destintas), embora inseparaveis, a primeira das quais retrata a relação amorosa do casal, recorrendo a analepses, pois desde o início é nos dado o desfecho de algo. Desfecho esse que não o do filme, mas sim da relação de Justin e Tessa, o que leva desde logo ao final deste assunto e ao início de algo totalmente oposto (?) ou talvez nem tanto.
A segunda parte é claramente um thriller com contornos políticos, embora seja muito redutor reduzir a segunda parte a um mero thriller, é mais uma viagem de descoberta, quer de um amor, uma mulher misteriosa que amava e não conhecia, quer seja pela descoberta de um continente Africano vivo, mas explorado e poucos passos da morte, em cores de inferno.

Mas ao contrário do que se poderia pensar, “O Fiel Jardineiro” é bem mais cruel que “A Cidade de Deus”, apesar de menos explicito, existe uma carga dramática, embora mais contido é mais preciso e directo, e acima de tudo é uma visão pura, documental em que Meirelles mantem a imparcialidade, filmando uma África que está aos olhos de todos nós, mas que por muitas razões não vemos. Daí o facto de atras ter referido que as duas partes, embora diferentes na sua forma no seu conteudo, o amor prevalece em Justin, seja o amor pela descoberta e pela realização do trabalho inacabado da sua amada, seja pela completa descoberta da abalada África e das pessoas que nela sobrevivem, que levam Justin , a modificar a sua visão e a amar cada uma daquela pessoas. E será o mais interessante a tirar da obra de Meirelles, se não se pode amar (ajudar) toda aquela gente, pelo menos uma delas.

A ansiosa e perpicaz visão de Meirelles, é completa pela dupla de interpretes, Ralph Fiennes e Rachel Weisz, cada um deles marcando as diferenças que os destinguem e que mais tarde os aproximaram... deslobrante acaba por ser a fabulosa contenção e evolução de Ralph Fiennes, assim como o secretismo e audácia de Rachel Weisz.

Em “O Fiel Jardineiro” existe uma forte carga reflectiva, mas que acaba por se conjugar na perfeição com o cinema enquanto entretenimento, o ritmo e a linguagem que parece ser uma clara marca de Fernando Meirelles, aliado a uma obra literária de Le Carré, com paisagens fotografadas de forma impressionante por César Charlone e ainda com uma Banda Sonora plena de ritmos tribais de Alberto Iglesias, transformam “O Fiel Jardineiro” numa obra cinematográfica única num género aparentemente adormecido, que poderá ser reconhecida na noite mais brilhante de Hollywood.

“O Fiel Jardineiro” é um thriller político, mas antes de mais é um apelo social... URGENTE.

NeTo – 9/10

Meirelles apresenta-se novamente com uma deconstrução narrativa e uma dinâmica visual capaz de misturar uma boa dose de entretenimento e uma visão dramática muito própria. E como já acontecia em “A Cidade de Deus” existiu uma exploração técnica, em “O Fiel Jardineiro” a mesma exploração existe, seja pela variada quantidade de suportes de captura de imagem, pelicula (35mm, 16mm), vídeo ou Web Cam.

4 Comments:

At 2:12 da tarde, Blogger Francisco Mendes said...

Fernando Meirelles efectua novamente milagres visuais que repercutem com sentimento e emprega uma face humana no sofisticado romance de John le Carré. Injecta o seu quinhão de energia, iluminando a adaptação com ressonância emocional e tensões temáticas.

Claramente um dos melhores do ano.

Cumprimentos!

 
At 7:39 da tarde, Anonymous Anónimo said...

5 estrelasA

 
At 1:03 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Este Fernando Meirelles sabe bem o que faz :)!

Abraço

 
At 9:32 da tarde, Blogger Fuazona said...

Honestamente achei que a boa historia do filme não consegue bater a imensa inercia durante as 7h? pareceram me 7h de filme. Numa palavra, para mim este filme foi uma SECA.

 

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