"Charlie and The Chocolate Factory" de Tim BurtonQuem tem seguido atentamente a firme carreira de Tim Burton, facilmente se apercebe de uma focalização temática, a relação familiar. Depois a maneira como é feita, tal como os grandes mestres do cinema, tudo é dissimulado, vamos observar "Eduardo Mãos de Tesoura", "Big Fish", este "Charlie and The Chocolate Factory" e até a curta-metragem "Vincent", e claramente nos paercebemos que Tim Burton, nunca utiliza um vilão para contar a sua história, antes de mais se centra nas suas personagens e nos seus conflitos interiores, numa espécie de mundo paralelo, que só o engenho e a inteligencia de Burton sabem criar.
Se em "Big Fish" a família era claramente um ponto de focalização, em "Charlie and The Chocolate Factory" é ainda mais visível, embora o primeiro filme seja um filme mais sóbrio e adulto, e o segundo mais fantasioso e infantil.
"Charlie and The Chocolate Factory" pretende representar a importância da família na educação das nossas crianças, é uma clara crítica ao capitalismo e ao poder do dinheiro e à consequente ganância, mas acima de tudo é um filme de sonhos, sacrifícios e amor familiar. Vejamos a relação familiar de Charlie, uma família sem dinheiro, mas que aceita a vida como ela é, sem qualquer tipo de amargura, ou então ela existe, mas não se agarram a ela, agarram-se antes ao sonho e à esperança e é essa força e união vinda da família que torna Charlie num menino tão especial. E depois na relação familiar que Willy Wonka tinha com o seu pai, que durante a infância impedia Willy de seguir os seus sonhos, o que fez com que partisse e deixa-se o pai sem qualquer tipo de notícias, embora viva claramente assombrado pela recordação da sua "infeliz" infância e pela consequente ausencia do seu pai.
Mas mais famílias existem, mas para isso há que tentar criar uma pequena síntese do filme, Willy Wonka é proprietário de uma fábrica de chocolate, que acaba de decidir conceder uma visita durante um dia a 5 crianças que encontrarem um cartão dourado dentro dos seus chocolates. Cada criança será acompanhada por um familiar, e terá no final da visita a mais incrível surpresa de toda a sua vida.
Ora, desde logo nesta visita temos 5 crianças diferentes e 5 familiares diferentes, cada qual com o seu estrato social vincado e consequentemente comportamentos opostos. Temos uma menina extremamente competitiva que faz tudo para alcançar o que quer, que se faz acompanha pela mãe, pois o seu pai não é apresentado. Depois temos uma criança de classe média baixa, com uma famíla que pouca atenção lhe dá, apenas deixando a educação do seu filho para uma televisão e para os video-jogos. Temos uma menina de classe alta, que tudo o que quer tem, pede, faz birra e o seu milionário pai, acaba por fazer as suas vontades. Depois temos aquela criança à qual os pais para compensar a ausencia dão doces e mais doces, reparamos que na apresentação desta criança, apenas a mãe dá alguma importância ao seu filho, quanto ao pai, está agarrado ao trabalho sem se dirigir à criança. E por fim, Charlie, que vive com pais e avós, que que na visita à fabrica se faz acompanhar, não pelo pai ou mãe, mas sim pelo avô... simples mas muito eficaz, com esta caracterização de personagens, Burton consegue mostrar até que ponto uma família é importante e ainda mais, uma família não é só o pai, ou só a mãe, são todos aqueles que nos rodeiam.
Tim Burton, sempre se mostrou como um enorme contador de histórias e como um dos mais originais criadores de "universos" do cinema actual. Em "Charlie and The Chocolate Factory" mais uma vez recorre ao seu universo, bizarro e surreal para criar mais um universo à parte.
Não será novidade para ninguém que o Gótico, o Surrealismo e o Expressionismo, sempre fizeram parte das invocações e referências de Tim Burton, mas nunca com tanto rasgo de côr. Para caracterizar os "décours" deste filme podemos misturar, um pouco do expressionismo alemão, com as cores e exageros do barroco. Este será mesmo o mais colorido e "alegre" filme de Burton, talvez mesmo superando "Marte Ataca".
Mais uma vez Tim Burton conta com o complemento sonoro de Danny Elfman, mais uma vez "colando" a sua sonoridade às imagens de Burton, com um resultado fabuloso. Desde a excelente composição que acompanha o genérico inicial (aos quai Burton tanta importância dá), até às magníficas "cantilenas" que os Oompa Loompa cantam a cada expulsão de uma criança, que contam com as letrar originais de Roald Dahl (escritor do original livro infantil em que se baseia o filme).
Existe também um fabuloso trabalho fotográfico de Philippe Rousselot ("Big Fish" e "Planeta dos Macacos"), que por momentos nos remete para o fabuloso mundo de "O Feiticeiro de Oz" a quando da entrada da Fabrica de Chocolate e também de um universo sombrio e infeliz da vida exterior, macando de formas distinta e eficaz os dois universos, os dois mundos paralelos.
Tim Burton, para a criação deste universo, chamou Danny Elfman e Rousselot, pessoas com quem trabalha frequentemente, e sendo Tim burton um realizador que se concentra tanto na criação das suas personagens e nos conflitos interiores, voltou a recorrer para interpretar uma das suas personagens, a um actor ("fétiche" pode mesmo dizer-se) que será por ventura o melhor actor da actualidade, ou pelo menos da sua geração, Johnny Depp.
Depp é Willy Wonka, ou melhor Willy Wonka é Depp. Depp é um actor que gosta de criar as suas personagens, que as vive intensamente, então Willi Wonka é caracterizado essencialmente pelo imaginário de Depp. São fabulosos os maneirismos de Depp, a elasticidade do seu rosto, as pequenas reacções, a sua vertente cómica e acima de tudo, as alterações constantes que a personagem exigiu, temos um Willy Wonka exterior e um Willy Wonka Interior, que vão consequentemente alternando entre si. Mais uma vez Johnny Depp tem um desempenho excepcional, mas se a Academia não o premiou com "Finding Neverland", também não será este ano.
Para fazer companhia a Depp, temos o «puto maravilha» de "Finding Neverland", Freddie Higmore, que com a sua humildade e olhar terno, dá vida a Charlie e "alimenta" o coração perdido de Willy Wonka. Mais uma vez Highmore mostra uma enorme "química" com Depp, serám muito complicado a qualquer cinéfilo esquecer as trocas de olhar tanto em "Finding Neverland" como em "Charlie and The Chocolate Factory".
Seria de todo injusto deixar de referir o excelenter Christopher Lee, como pai grotesco de Willy Wonka e ainda um enorme David Kelly no papel de Avô de Charlie que enche ainda mais de ternura e comédia o espírito do filme.
Com "Charlie and The Chocolate Factory", Tim Burton dá mais um enorme e firme passo, como um dos maiores realizadores da actualidade, apesar de um argumento superficial e até de personagens esteriotipadas, na verdade Burton realizaou um filme repleto de momentos bellíssimos e assima de tudo, tal superficialidade beneficia em grande parte dos momentos a transmissão e assimilação da mensagem, embora fosse preferível um momento mais forte lá para o final do filme.
Não é o melhor que Burton nos ofereceu, mas é muito melhor que a maioria do cinema que temos visto nos ultimos tempos. Se o cinema é uma fonte de imaginação para todo o mundo, Tim Burton é um dos grandes responsaveis, na actualidade.
NeTo - 9/10
Uma palavra ainda para a excelente Direcção artística.
P.S. - Reparem bem na fotografia abaixo colocada. Digam lá se não vos faz recordar alguma coisa?